quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

SANDRA





Há amizades que duram vidas. Conheço esta miúda desde os 12 anos. É tão importante na minha vida que "a coloquei" no meu livro, sem filtros.
 
" (...) Telefonei à Sandra: precisava falar sobre esta psicóloga. Fomos ao Colombo ao fim da tarde. Em cada loja que entrava comprava qualquer coisa: que paciência!! Mas ia-me ouvindo entre “o que achas deste conjunto para as botas castanhas?” e “esta mala é uma tara, apesar de cara. Tenho que pedir um aumento à Raquel”.
– Mas se fores à psicóloga ela cura-te essa angústia matinal? – perguntou enquanto colocava centenas de pulseiras nos pulsos.
– Não é só angústia matinal – estive quase a confessar- me, – é tudo. É a Luz, a Raquel, o desassossego em mim.
– Falta de sexo. Há quanto tempo não tens namorado? – perguntou enquanto enfiava um vestido todo florido.
 – Não quero namorados. Onde os encaixava no meu dia? – Desculpei-me atabalhoadamente. – Oh Alice, namorar pode ser bom. Podes encontrar o “tal” e descontrair. Tu andas tensa. Vamos sair hoje? Não há nada que um vodka não cure – e puxou-me para entrar na vigésima sétima loja – já compraste alguma coisa? – perguntou enquanto mexia nas sandálias perto do manequim.
– Não me estás a levar a sério. Vamos beber um café. Estou farta de tanta roupa – desabafei.
 – Farta de roupa? Pois, tens mesmo de ir à psicóloga – gozou.
 – A sério. A quem contarei estas coisas? As minhas angústias, os meus medos, as minhas inseguranças? – quase gritei. A Sandra agarrou-me no pulso, tropeçou nos dez sacos que levava, sabe Deus como, e arrastou-me até uma esplanada.
– Oh mulher, mas o que é que se passa? – interrogou com aqueles olhos azuis muito abertos
 – Acordaste? – perguntei. – Não é isso. Não estava a entender que era “grave” – choramingou.
 – Também não precisas chorar – conclui chamando o empregado.
 – Mas que merda de angústia é essa? Andas a tomar alguma substancia ilícita? Olha que quem se mete nessas coisas, não sai de lá mais. A amiga do Frederico, sabes? Aquela muito gira que usa sempre calças justas… Abanei a cabeça. Sabia que estava no bom caminho. Finalmente a Sandra estava a ouvir-me mas primeiro precisava de se ouvir a ela.
– Okay! Deves mesmo tratar-te. Como se chama a psicóloga? Não, não a conheço…mas parece que a Bela, aquela minha amiga de Carcavelos, sabes? A que andou com o tio do Carlos? Sabes sim… ela até é um bocado foleira…
 – Stop!!!! – gritei.
 – Ai!!! Então? – perguntou enquanto dava uma dentada numa bola de berlim – eu não devia comer isto. – Eu não estou bem – confessei. – Mas fizeste exames, análises? Desculpa lá amiga mas não contes comigo para te acompanhar. Sabes o pânico que tenho de agulhas. A Dora andava mal e era cancro – agarrou-me na mão. – Mas tu não tens nada. Amiga, conta- -me tudo – e terminou a bola de berlim. – Tu cansas-me. Para. Só preciso do teu apoio. Vou marcar uma consulta e depois tenho-te a ti para o “desabafo”. Para me dares também a tua opinião. Para trilhares caminhos comigo. – Amiga, já os trilho há muito tempo. Também tenho essas angústias, essas inseguranças mas vingo-me nisto. Adoro roupa, adoro andar na moda, adoro bolas de berlim e Cérelac – sorriu. – Vamos para tua casa e no caminho. (...)" in "A ALICE MORA AQUI

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