Há amizades que duram vidas. Conheço esta miúda desde os 12 anos. É tão importante na minha vida que "a coloquei" no meu livro, sem filtros.
" (...) Telefonei à Sandra: precisava falar sobre esta psicóloga.
Fomos ao Colombo ao fim da tarde. Em cada loja que entrava comprava qualquer
coisa: que paciência!! Mas ia-me ouvindo entre “o que achas deste conjunto para
as botas castanhas?” e “esta mala é uma tara, apesar de cara. Tenho que pedir
um aumento à Raquel”.
– Mas se fores à
psicóloga ela cura-te essa angústia matinal? – perguntou enquanto colocava
centenas de pulseiras nos pulsos.
– Não é só angústia matinal – estive quase a confessar- me,
– é tudo. É a Luz, a Raquel, o desassossego em mim.
– Falta de sexo. Há quanto tempo não tens namorado? –
perguntou enquanto enfiava um vestido todo florido.
– Não quero
namorados. Onde os encaixava no meu dia? – Desculpei-me atabalhoadamente. – Oh
Alice, namorar pode ser bom. Podes encontrar o “tal” e descontrair. Tu andas
tensa. Vamos sair hoje? Não há nada que um vodka não cure – e puxou-me para
entrar na vigésima sétima loja – já compraste alguma coisa? – perguntou
enquanto mexia nas sandálias perto do manequim.
– Não me estás a levar a sério. Vamos beber um café. Estou
farta de tanta roupa – desabafei.
– Farta de roupa?
Pois, tens mesmo de ir à psicóloga – gozou.
– A sério. A quem
contarei estas coisas? As minhas angústias, os meus medos, as minhas
inseguranças? – quase gritei. A Sandra agarrou-me no pulso, tropeçou nos dez
sacos que levava, sabe Deus como, e arrastou-me até uma esplanada.
– Oh mulher, mas o que é que se passa? – interrogou com
aqueles olhos azuis muito abertos
– Acordaste? –
perguntei. – Não é isso. Não estava a entender que era “grave” – choramingou.
– Também não precisas
chorar – conclui chamando o empregado.
– Mas que merda de
angústia é essa? Andas a tomar alguma substancia ilícita? Olha que quem se mete
nessas coisas, não sai de lá mais. A amiga do Frederico, sabes? Aquela muito
gira que usa sempre calças justas… Abanei a cabeça. Sabia que estava no bom
caminho. Finalmente a Sandra estava a ouvir-me mas primeiro precisava de se
ouvir a ela.
– Okay! Deves mesmo tratar-te. Como se chama a psicóloga?
Não, não a conheço…mas parece que a Bela, aquela minha amiga de Carcavelos,
sabes? A que andou com o tio do Carlos? Sabes sim… ela até é um bocado foleira…
– Stop!!!! – gritei.
– Ai!!! Então? –
perguntou enquanto dava uma dentada numa bola de berlim – eu não devia comer
isto. – Eu não estou bem – confessei. – Mas fizeste exames, análises? Desculpa
lá amiga mas não contes comigo para te acompanhar. Sabes o pânico que tenho de
agulhas. A Dora andava mal e era cancro – agarrou-me na mão. – Mas tu não tens
nada. Amiga, conta- -me tudo – e terminou a bola de berlim. – Tu cansas-me.
Para. Só preciso do teu apoio. Vou marcar uma consulta e depois tenho-te a ti
para o “desabafo”. Para me dares também a tua opinião. Para trilhares caminhos
comigo. – Amiga, já os trilho há muito tempo. Também tenho essas angústias,
essas inseguranças mas vingo-me nisto. Adoro roupa, adoro andar na moda, adoro
bolas de berlim e Cérelac – sorriu. – Vamos para tua casa e no caminho. (...)" in "A ALICE MORA AQUI
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